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Domingo estive com os meus primos mais novos depois de uma eternidade sem lhes pôr a vista em cima. As últimas vezes que os vi não foi pêra doce. Estão incontroláveis e prós em desafiar autoridade. Ainda que tenha muita paciência para crianças, não consigo lidar com miúdos mal educados e que teimam em ignorar a palavra dos mais velhos. Nas últimas vezes que estive com eles não lhes dispensei muita atenção exactamente por causa disso, contudo a situação não esteve muito grave na Páscoa.
Dos dois filhos da minha prima, o mais velho já se acha crescido. Fala-me como se fosse adolescente, como se fosse imperativo saltar a infância porque só a palavra implica algo mau. Está um verdadeiro viciado em telemóvel. Tem oito anos e está completamente viciado nas tecnologias. Está sempre agarrado à porcaria de um smartphone, a jogar, a ver vídeos no youtube e nesta última vez já me falou de facebook, ficando super chocado porque eu e as minhas irmãs não temos a aplicação no telemóvel e ele, mais novo, estava sempre lá.
Por mais do que uma vez vi a minha prima a falar com ele e a querer dar uma de mãe super responsável, tirando-lhe o telemóvel das mãos e a afirmar, com desgosto, como ele estava viciado e ela gostava que ele fizesse coisas mais produtivas em vez de estar sempre colado ao aparelho. Eu fiquei calada, mas, hey: de quem é a culpa? Se há coisa que mexe com os meus nervos é esse tipo de afirmações da parte dos pais quando são eles os culpados: O meu filho é tão guloso! Quem me dera que não comece tantos doces! E, no entanto, está ao mesmo tempo a estender-lhe um chupa. Com as tecnologias é a mesma coisa. Queixam-se que os filhos estão viciados nos telemóveis, mas impingem-nos às crianças, desde pequenas, para as calar. O resultado? Crianças que sabem mexer em computadores, telemóveis, tablets, antes mesmo de saberem andar e falar. Toda a mudança precisa de um ponto de partida e neste tipo de casos acredito que deve partir dos próprios pais. No que toca ao assunto que comecei por mencionar: só vejo o caso dos meus primos a piorar.
A minha prima está sempre com o telemóvel na mão. Sempre. Sempre distraída porque todo o seu cérebro está consumido pelo iphone e o mundo virtual. Domingo a sua dependência irritou-me quando a filha andava a vaguear pela sala com um nenuco e umas figuras que horas antes tinham sido descobertas de um bloco de cimento - um kit de arqueologia que a minha mãe tinha oferecido ao seu irmão como amêndoa da Páscoa -. Eu estava a ver televisão mas apercebi-me da pequena a ir ter com a mãe e a pedir atenção. Tudo o que ela queria era brincar e a minha prima o que fez foi bufar e dizer-lhe que não tinha paciência e estava ocupada. Não tinha paciência para brincar com a filha, entretê-la com um bocado de atenção.
A sua afirmação revoltou-me e fez-me lembrar o Natal quando o seu mais velho foi a minha casa, viu a minha amostra de árvore de Natal, ficou muito espantado, pediu à minha prima para fazerem a deles e ela lhe respondeu que não tinha tempo para isso. A sua mais nova é um diabinho: é um facto. Lidar com ela não é fácil, mas sempre a consegui abordar da maneira certa. Por muito mal que ela se costume portar, decidi, naquele momento, que se a pequena viesse ter comigo, eu iria proporcionar-lhe o que ela queria porque o que ela pedia não era nada de mais. A miúda acabou mesmo por ir para ao pé de mim e eu fiz de médica, de mãe de um nenuco, explorei ruínas sobre a mesa do lanche, falei sobre gigantes e sobre a magia de encontrar coisas anteriormente perdidas. A pequena estava feliz. Estava colada ao meu colo, recusava-se a sair de lá e eu fiquei feliz por a ver tão entretida e servida com aquilo que precisava: atenção. A minha prima? Ficou o tempo todo ao meu lado. O que era importante e a mantinha ocupada para não poder dar atenção à filha? O facebook. A porcaria do facebook. É extremamente irónico ela dizer que o seu filho é um viciado quando ela é infinitamente pior que ele e este tem, obviamente, a quem sair.